domingo, 18 de julho de 2010

Visão das coisas


Com sua Ética, uma obra rigorosa, o filósofo judeu perscrutou a realidade e desfez algumas de nossas mais caras ilusões

 

Texto: José Francisco Botelho | foto: Flavio Demarchi | design: Adriana Wolff


Judeu holandês de origem portuguesa, o afável e enigmático Baruch Spinoza (1632-1677) goza de um dos destinos póstumos mais estranhos na história da filosofia. Ainda em vida, foi considerado um herege perigoso pelo judaísmo e pelo cristianismo e taxado como “o mais ímpio ateu que já pisou sobre a terra” – ironia colossal, pois a essência de sua obra é uma metódica obsessão por Deus. Representante máximo do “monismo lógico” – a ideia de que toda a realidade forma um único ser – Spinoza engendrou, com uma espécie de fanatismo geométrico, uma divindade fantasticamente real e racionalmente mirabolante, base de um sistema ético que muitos admiram e poucos conseguem seguir. Cem anos após a morte de Spinoza, o inglês David Hume descreveu seu pensamento como um “monstro abominável”. Reabilitado a partir do século 19, o suposto criador de monstros foi considerado “o mais amável dos grandes pensadores” por Bertrand Russell. Se houvesse previsto tamanha controvérsia, é provável que Spinoza houvesse reagido com enfado ou decepção: impermeável à vaidade e aos rancores, ele detestava polêmicas, e consta que jamais tenha erguido a voz contra um adversário. Em sua época, até os críticos mais inflamados admitiam a contragosto: aquele era um herege estranhamente bondoso, um criador de escândalos que se comportava com moral impecável e gentileza imbatível.

Mais que tudo isso, Spinoza foi uma espécie de náufrago tranquilo flutuando entre culturas e sistemas de pensamento: suspenso entre a religião e a geometria, entre o judaísmo e o mundo gentio, ele foi um racionalista impregnado de fulgores teológicos, um santo que negou o poder da fé, um homem desditado que considerava a felicidade um dever e quase uma fatalidade. Sua obra é, linha por linha, uma das mais desafiadoras da filosofia – mas, por trás da casca magnificamente árdua de suas ideias, pulsa um apaixonante sistema metafísico. Não por acaso, Spinoza exerceu um fascínio avassalador sobre mentes rigorosas e imaginativas como a do argentino Jorge Luis Borges – que, numa comovente homenagem em versos, comparou a mandala filosófica do judeu herege a um “claro labirinto”.

O abençoado

A história do “mais amável dos filósofos” é um capítulo exemplar na odisseia do povo judeu no Ocidente. Durante séculos, os ancestrais do grande pensador viveram em Portugal sob o império do Islã, que na época era bem mais tolerante que seus vizinhos cristãos. Após a expulsão definitiva dos mouros, em 1492, os judeus espanhóis e portugueses passaram a sofrer perseguições. Os que não foram queimados fugiram para terras menos ardorosas – como a Holanda, para onde os Spinoza emigraram no início do século 17. Nascido em Amsterdã, Baruch falava a língua da terra (o holandês) e a língua da tribo (o hebraico), mas seu primeiro idioma foi o de Camões. Entre os familiares, era chamado de “Bento”, versão lusófona de Baruch (que significa “homem abençoado”).

Em uma escola rabínica, estudou o Talmude, a Torá e teólogos judaicos medievais. Aluno favorito, parecia destinado a ser um luminar da fé. Mas se desviou dos dogmas: hipnotizado pelas descobertas científicas de sua época, o jovem Bento virou leitor assíduo de Descartes, filósofo francês que pregava a investigação da natureza por meio de um método estritamente racional. Aos 23 anos, o “homem abençoado” se transformara em uma figura com opiniões perigosas: entre os amigos, costumava dizer que os milagres da Bíblia eram metáforas ou alucinações. Em 1656, foi convocado pelos anciãos da comunidade e sofreu o herem – espécie de excomunhão judaica. O texto do anátema sobrevive até hoje, em macabras minúcias: “Com o julgamento dos Anjos e dos Santos, nós excluímos, expulsamos, amaldiçoamos e esconjuramos Baruch Spinoza... Que ele seja maldito durante o dia, e maldito à noite; que seja maldito deitado, e maldito ao se levantar; maldito ao sair, e maldito ao entrar... Ninguém deverá conversar com ele, nem lhe prestar favores, nem se aproximar dele mais de quatro côvados; e que ninguém leia qualquer documento escrito por sua mão”.

Deserdado pela família e coberto de imprecações bíblicas, Spinoza passou a viver estoicamente em uma água-furtada, ganhando seus parcos recursos com o polimento de lentes para microscópios e telescópios, ofício que praticava com a mesma paciência artesanal dedicada à filosofia. Produziu uma série de tratados na solidão de seu quarto, deixando a maioria dos manuscritos trancados na mesa de cabeceira, com instruções para que fossem publicados após sua morte (que veio cedo). Com a saúde destruída pela inalação do pó de vidro de suas lentes, ele morreu de insuficiência respiratória aos 44 anos. Nos séculos seguintes, o secreto tesouro guardado nas gavetas de sua mesa mudaria a história do pensamento. Ao contrário do que se poderia imaginar, a amargura e o desespero inexistem na obra desse homem frágil, solitário e modesto: seu pensamento não é um grito de revolta contra o destino, mas uma geométrica ode de amor à realidade.

Tabuleiro de ideias

A obra-prima de Spinoza é a Ética Demonstrada pelo Método Geométrico – ou, entre os íntimos, simplesmente Ética. Construído como um tratado matemático, o livro é semelhante a um complexo jogo de xadrez, em que cada parágrafo é uma peça num minucioso tabuleiro de ideias. Conforme explica o título, o objetivo da obra é delinear a doutrina de vida mais adequada ao homem sábio – mas, antes de computar a natureza humana, Spinoza trata de decifrar o próprio universo. Logo nas primeiras páginas, somos arrastados em um ordenado turbilhão metafísico, em que o autor oferece sua solução a uma antiga perplexidade filosófica: o dilema entre a multiplicidade e a unidade do cosmos.
Percebemos o mundo ao nosso redor como uma infinidade de seres individuais, mas ao mesmo tempo intuímos que tudo o que existe está, de certa forma, interligado em um todo orgânico. Alguns filósofos, como Heráclito, afirmaram que a unidade é ilusão: apenas o fragmento é real. Já Spinoza representa o polo oposto. Para ele, o universo é formado por uma única e indivisível substância (do latim substantia, literalmente, o que está por baixo). Ele chega a essa conclusão por uma impecável acrobacia lógica: sabemos que o homem é formado por diversas partes e, ainda assim, nós o consideramos um único ser; por que, então, não aplicamos o mesmo raciocínio ao Universo? Logo, toda a realidade é de fato um único indivíduo. Um ser infinito e eterno, simétrico e assombroso, que abarca todas as coisas, e do qual somos efêmeras manifestações: Deus, que Spinoza também chama de Natureza. “Tudo o que existe, existe em Deus, e sem Deus, nada pode existir nem ser concebido”, ele afirma com escandalosa serenidade.

No pensamento religioso tradicional, Deus e o mundo existem separadamente: às vezes colérico, às vezes afetuoso, o Jeová bíblico criou tudo o que existe, e pode a tudo destruir a seu bel-prazer. Já o ateísmo afirma que Deus é um delírio humano, e que apenas o mundo existe, em materialista solidão. O pensamento de Spinoza opõe-se diametralmente a ambas as ideias. Para ele, apenas Deus realmente existe: ele não criou o mundo, nem pode destruí-lo, pois é o próprio mundo. Esse ser absoluto é dotado de infinitas qualidades ou atributos, dos quais conhecemos apenas dois: o pensamento e a extensão (ou seja, o espaço, no qual se inclui a matéria). Deus é tudo o que existe no espaço, tudo o que se forma na mente, e mais uma infinidade de coisas e dimensões que ignoramos. Sendo infinito, ele se manifesta em formas incessantes e inacabáveis: as estrelas, os planetas, os sóis, as árvores, as pedras, eu, você, nossos antepassados, nossos possíveis descendentes, nossos medos, nossas emoções, nossa vida e nossa morte, tudo são partículas sempre mutáveis de uma realidade absoluta que, em si mesma, não muda nunca e jamais perece.

A vertiginosa divindade natural de Spinoza nada tem a ver com o autocrata demasiado humano das religiões monoteístas. Assim como não amamos individualmente as moléculas de nosso corpo, o Deus de Spinoza não ama nem odeia ninguém: apenas contempla a si mesmo, infinitamente. Os homens, portanto, devem amar a Deus – ou seja, a própria realidade – sem esperar que o sentimento seja correspondido ou recompensado. Para os teólogos tradicionais, esse ser supremo, impessoal e cosmicamente egoísta era uma aberração. Daí o paradoxal rótulo de ateísmo lançado contra o autor da Ética – que, séculos mais tarde, seria descrito como “o homem bêbado de Deus” pelo poeta alemão Novalis. Mas o intoxicante panteísmo de Spinoza nada tem de supersticioso: o homem sábio não deve temer a divindade com fé cega, mas compreendê-la por meio da razão. E é nesse “amor intelectual a Deus” que o adorável apóstata identifica a chave para a paz de espírito.

Paixões cegas

Para Spinoza, as agruras congênitas da raça humana são resultado de uma ilusão de ótica: dominados por emoções irracionais, enxergamos as coisas separadamente e nos deixamos atordoar pelo espetáculo da destruição e do aparente absurdo da vida. O homem sábio é aquele que enxerga as coisas sub specie aeternitatis – ou seja, sob a perspectiva da eternidade. Se Deus é a causa de todas as coisas, então tudo ocorre por necessidade lógica: nada poderia ser diferente do que é. Não existe livre-arbítrio na vida humana, assim como não há acaso no mundo físico. Imaginemos que o autor desta crônica saia à rua e seja atingido por um raio: caso sobreviva, e caso decida seguir à risca a doutrina de Spinoza, ele deve consolar-se com a ideia de que o relâmpago foi causado pela posição das nuvens, que foram impelidas pelo vento, que foi gerado por uma agitação dos oceanos – e assim sucessivamente, numa cadeia de causas infinitas e necessárias. Da mesma forma, seria impossível que eu houvesse saído de casa em um momento diferente: para que isso ocorresse, toda a história do universo teria de ser outra. Em outras palavras: as ações e escolhas humanas – tudo o que você, eu e o resto da humanidade fazemos ou deixamos de fazer – são resultados de equações tão necessárias e imutáveis quanto as leis da física.

A princípio, essa doutrina pode ter algo de opressivo. Mas, em última instância, ela oferece uma promessa de libertação íntima: compreendendo seus próprios limites, o sábio quebra os grilhões irracionais da angústia. A dor, a imperfeição e o sofrimento existem apenas quando olhamos as partes incompletas do todo: a visão da realidade total anula as ranhuras mínimas de nossas vidas e nos liberta da ilusão do tempo. Pois – afirma Spinoza – o passado, o presente e o futuro são meras imaginações humanas. Para a mente divina, tudo ocorre simultaneamente e de forma predeterminada. Se conseguirmos compartilhar essa visão atemporal do mundo, perceberemos que o medo, a angústia, o remorso e a culpa são emoções absurdas. Afinal de contas, se o futuro é tão imutável quanto o passado, resta-nos apenas relaxar e fruir as alegrias possíveis nessa jornada inescrutável cujos rumos jamais poderemos controlar.

Como notaram muitos comentaristas, esse determinismo implacável é um exercício arriscado e que, mal dosado, pode levar à inação irresponsável. Por outro lado, há nas ideias de Spinoza um bálsamo sempre útilàqueles que deparam com a face violenta e incontrolável da existência: somos ínfimos e passageiros, mas é exatamente em nossa pequenez que encontramos a plenitude. Pois, se a substância da realidade não nos ama, pelo menos ela nos justifica. Teoria difícilde colocar em prática – mas o leitor que chegar à última página da Ética terá descoberto que os tesouros mais valiosos são às vezes os mais árduos. Assim escreve o embriagado geômetra de Deus no desfecho de sua obra: “O caminho que conduz à beatitude é áspero e íngreme, mas pode ser encontrado. E deve certamente ser árduo aquilo que tão raramente se encontra. Pois se a salvação estivesse à disposição e pudesse ser encontrada sem maior esforço, como explicar que ela seja negligenciada por quase todos? Tudo o que é precioso é tão difícilquanto raro”.


LIVROS Ética, Spinoza, Autêntica
Compreender Spinoza,
Hadi Risk, Vozes

Fonte: Revista Vida Simples



sexta-feira, 16 de julho de 2010

Aristóteles - O mundo da experiência, as quatro causas, ética e política



Por Antonio Carlos Olivieri* 

Em 1996, descobriu-se em Atenas, Grécia, o sítio arqueológico onde funcionou o Liceu - a escola fundada por Aristóteles (384-322 a.C.), para concorrer com a Academia, a escola anterior, fundada por seu antigo professor, Platão (427-347 a.C.). A fundação do Liceu não reflete nenhuma ingratidão do discípulo com seu mestre, que por sinal já havia morrido cerca de dez anos quando a escola aristotélica surgiu (336 a.C.).

Aluno de Platão, a quem reconhecia o gênio, Aristóteles passou a discordar de uma idéia fundamental de sua filosofia e, então, o pensamento dos dois se distanciou. Talvez seja esse o ponto de partida para se falar da obra filosófica aristotélica.

Platão concebia a existência de dois mundos: aquele que é apreendido por nossos sentidos - por assim dizer, o mundo concreto -, que está em constante mutação; e um outro mundo - abstrato -, o mundo das idéias, imutável, independente do tempo e do espaço, que nos é acessível somente pelo intelecto.

O mundo da experiência

Para Aristóteles, existe um único mundo: este em que vivemos. Só nele encontramos bases sólidas para empreender investigações filosóficas. Aliás, é o nosso deslumbramento com este mundo que nos leva a filosofar, para conhecê-lo e entendê-lo.

Aristóteles sustenta que o que está além de nossa experiência não pode ser nada para nós. Nesse sentido, ele não acreditava e não via razões para acreditar no mundo das idéias ou das formas ideais platônicas.

Porém, conhecer o mundo da experiência, "concreto", foi um desejo ao qual Aristóteles se entregou apaixonadamente. Assim, ele descreveu os campos básicos da investigação da realidade e deu-lhes os nomes com que são conhecidos até os nossos dias: lógica, física, política, economia, psicologia, metafísica, meteorologia, retórica e ética.

Aliás, ele inventou também os termos técnicos dessas disciplinas e eles também se mantêm em uso desde então. Exemplos? Energia, dinâmica, indução, demonstração, substância, essência, propriedade, categoria, proposição, tópico, etc.

O que é ser?

Filósofo que sistematizou a lógica, Aristóteles definiu as formas de inferência que são válidas e as que não são, além de nomeá-las. Durante dois milênios, estudar lógica significou estudar a lógica aristotélica.

Aristóteles aplicou a lógica, antes de mais nada, para responder a uma questão que lhe parecia a mais importante de todas: o que é ser?, ou, em outras palavras, o que significa existir? Primeiramente, o filósofo constatou que as coisas não são a matéria de que se constituem.

Por exemplo, uma pilha de telhas, outra de tijolos, vigas e colunas de madeira não são uma casa. Para se tornarem casa, é necessário que estejam reunidas de um modo determinado, numa estrutura muito específica e detalhada. Essa estrutura é a casa; e os materiais, embora necessários, podem variar.

Com o tempo, nosso corpo está em constante mutação - transforma-se da infância para adolescência, desta para a idade adulta e, finalmente, para a velhice. Nem por isso deixamos de ser nós mesmos. Da mesma maneira, um cão é um cão em virtude de uma organização e estrutura que ele compartilha com outros cães e que o diferencia de outros animais que também são feitos de carne, pelos, ossos, sangue...

As quatro causas

Para Aristóteles uma coisa é o que é devido a sua forma. Como, porém, o filósofo entende essa expressão? Ele compreende a forma como a explicação da coisa, a causa de algo ser aquilo que é. Na verdade, Aristóteles distingue a existência de quatro causas diferentes e complementares:



  • Causa material: de que a coisa é feita? No exemplo da casa, de tijolos.







  • Causa eficiente: o que fez a coisa? A construção.







  • Causa formal: o que lhe dá a forma? A própria casa.







  • Causa final: o que lhe deu a forma? A intenção do construtor.

    Embora Aristóteles não seja materialista (vimos que a forma não é a matéria), sua explicação do mundo é mundana, está no próprio mundo. Finalmente, para o filósofo, a essência de qualquer objeto é a sua função. Diz ele que, se o olho tivesse uma alma, esta seria o olhar; se um machado tivesse uma alma, esta seria o cortar. Entendendo isso, entendemos as coisas.

    Mas o pensamento aristotélico não se limitou a essa área da filosofia que podemos chamar de teoria do conhecimento ou epistemologia. Deixando de lado os domínios que deram origem a outras ciências e nos limitando à filosofia propriamente dita, Aristóteles ainda refletiu sobre a ética, a política e a poética (que, no caso, compreende não apenas a poesia, mas a obra literária e teatral).



    Ética e política

    No campo da ética, segundo Aristóteles, todos nós queremos ser felizes no sentido mais pleno dessa palavra. Para obter a felicidade, devemos desenvolver e exercer nossas capacidades no interior do convívio social.

    Aristóteles acredita que a auto-indulgência e a autoconfiança exageradas criam conflitos com os outros e prejudicam nosso caráter. Contudo, inibir esses sentimentos também seria prejudicial. Vem daí sua célebre doutrina do justo meio, pela qual a virtude é um ponto intermediário entre dois extremos, os quais, por sua vez, constituem vícios ou defeitos de caráter.

    Por exemplo, a generosidade é uma virtude que se situa entre o esbanjamento e a mesquinharia. A coragem fica entre a imprudência e a covardia; o amor-próprio, entre a vaidade e a falta de auto-estima, o desprezo por si mesmo. Nesse sentido, a ética aristotélica é uma ética do comedimento, da moderação, do afastamento de todo e qualquer excesso.

    Para Aristóteles, é a ética que conduz à política. Segundo o filósofo, governar é permitir aos cidadãos viver a vida plena e feliz eticamente alcançada. O Estado, portanto, deve tornar possível o desenvolvimento e a felicidade do indivíduo. Por fim, o indivíduo só pode ser feliz em sociedade, pois o homem é, mais do que um ser social, um animal político - ou seja, que precisa estabelecer relações com outros homens.



    O papel da arte

    A poética tem, para Aristóteles, um papel importantíssimo nisso, na medida em que é a arte - em especial a tragédia - que nos proporciona as grandes noções sobre a vida, por meio de uma experiência emocional. Identificamo-nos com os personagens da tragédia e isso nos proporciona a catarse, uma descarga de desordens emocionais que nos purifica, seja pela piedade ou pelo terror que o conflito vivido pelas personagens desperta em nós.

    Tudo isso é, evidentemente, um resumo ultra-sintético do pensamento aristotélico. Sua obra é gigantesca, apesar de a maior parte dela ter se perdido ao longo dos tempos. O que chegou até nós corresponde a 1/5 de sua produção. São notas suas e de seus discípulos que passaram nas mãos de estudiosos da Antigüidade, da Idade Média (parte dos quais em países islâmicos), e que foram reorganizadas pela posteridade.

    Principalmente em função disso, a leitura de Aristóteles é difícil e seus textos não possuem a qualidade artística que encontramos nas obras de Platão. Para conhecer os aspectos relacionados às ciências na obra aristotélica clique aqui.



    Bibliografia

    • "História da Filosofia", Julián Marías, Martins Fontes, 2004.
    • "História da Filosofia", Bryan Magee, Edições Loyola, 2001.
    • "Dicionário de Filosofia", Nicola Abbagnano, Martins Fontes, 2000.





  • *Antonio Carlos Olivieri é escritor, jornalista e diretor da Página 3 Pedagogia & Comunicação. 

    sexta-feira, 2 de julho de 2010

    De Ulisses a Dunga, por Luiz Antônio Corte Real*

     
    Todos os povos têm seus heróis. E precisam deles para alimentar a autoestima de seus cidadãos. Assim foi no passado. Assim é no presente. Mas os heróis de hoje não são os heróis de antigamente. Perscrutando a história da civilização, em todos os tempos encontramos heróis. Já na vetusta Atenas, eram eles festejados como deuses. Homero, o inesquecível poeta grego, descreveu, em seus ainda lidos poemas, as aventuras do ardiloso guerreiro Ulisses, que, na Guerra de Troia, se notabilizou por conceber o cavalo de Troia. Seus dois poemas, Ilíada e Odisseia, eram lidos para os jovens estudantes atenienses, para que eles conhecessem, admirassem e imitassem esse herói. A autoestima do povo era sustentada e alimentada através da narrativa dos feitos de Ulisses, exemplo para todos.

    Os anos se passaram, e muitos foram os heróis celebrados pelos homens nesses 2,5 mil anos. Mas muita coisa se modificou. Assim, em nosso século, as guerras não encontram mais espaço, pois vivemos hoje, com poucas e pontuais exceções, na paz perpétua que Emanuel Kant pregava (século 18). Se, entretanto, as guerras, que eram um fato corriqueiro, cessaram, os heróis continuam sendo uma necessidade e uma realidade para os povos do agora. Onde, então, buscá-los? As pistas de atletismo, os ginásios de esporte, os campos de futebol, substituíram o cenário sangrento das guerras de conquista por territórios, das hostilidades entre atenienses e troianos. É dos esportes e do atletismo que saem, agora, nossos heróis. Progredimos. Pois para termos nossos heróis, não precisamos mais recorrer a trágicas batalhas. Buscamo-los nas pugnas esportivas, onde as lanças e espadas são substituídas pelas pistas, piscinas, quadras de esporte e bolas de futebol. É certo que o mundo mudou. Mas não a ânsia por heróis. São eles imprescindíveis para nos animar, para nos unir sob o signo de uma bandeira, para nos encher de contentamento, para enriquecer nossas esperanças, para nos tornar mais nós.

    Por isso, a Copa do Mundo é tão importante. Através dela, os heróis do presente mostram para o mundo que existimos, que temos importância, que somos gente. Em lugar de Ulisses, temos Dunga, Kaká, Júlio César, Lúcio, Robinho, e todos os outros jogadores que se encontram na África do Sul para dizer, com seus tiros certeiros, que não matam, mas que atingem o amor próprio de nossos “inimigos”, que o verde e o amarelo existem, e que não é só o povo norte-americano que pode, pois também nós podemos.

    Parte Ulisses, ficam Dunga e seus heróis, a nos encher de satisfação e alegria.

    *Contista e bacharelando em Filosofia

    Fonte: Jornal Zero Hora 
    imagem em: topicos.estadao.com.br/fotos-sobre-selecao-br..

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